POEMAS DE COR: REPLICANTE

Saio de casa e me encontro
Em cada esquina replicado.
A cada sinal, lavando carros,
Nos guetos, no carinho remunerado.

Estou a bombordo do navio negreiro,
No lado de dentro do tombadilho.
Estou nas gangues, nas siglas urbanas,
E nos massacres de jornal.

Sou eu, replicado, quem fuma pela manhã,
Desmaia no pelourinho a tarde.
Visita a delegacia a noite
E morre na madrugada.

Sou eu quem foge da escola
E não chega à faculdade.
Vive menos que a maioria,
Se alimentando de outra cor.

Sou eu quem escreve, descrente
"Amor... só de mãe"
"Nunca a vi, nem a conheço",
Apenas lembranças esmaecidas...

Por isso me encontro todos os dias,
Vejo a caixa de luz me confrontando.
Ferindo minha pele... alisando meu cabelo,
Clareando meus olhos, esquecendo de mim.

Por isso insisto em sair de casa,
Me enxergando em outras dimensões.
Me olhando, replicado...
Reconhecido em minha gente.

Sou eu a voz que leva o inconformismo,
Fui eu a cópia que chegou à faculdade.
Sou eu a réplica de cabelo crespo,
Sou eu que olho para mim...

Mas, no fundo, sou um igual.
Estou nas esquinas, nas ruas.
A cada sinaleira, nas gangues... armado.
Com cano apontado para a cabeça.





CONVERSATION

0 comentários:

Postar um comentário

Back
to top